“RUA GUAICURUS” INVESTIGA A PROSTITUIÇÃO DE DENTRO PRA FORA, COM VIGOR E DIGNIDADE

Por Celso Sabadin.

Assim como acontece com outra ótima estreia desta semana – “O Rio de Janeiro de Ho Chi Mihn” – o longa “Rua Guaicurus” também borra totalmente as fronteiras entre a ficção e o documentário. Fronteiras, aliás, cujas existências se justificam cada vez menos: qual a necessidade, afinal, de se colocar filmes em caixinhas separadas?

Sem a menor intenção de deixar claro o que foi efetivamente encenado e o que é fruto de registro documental, o roteirista e diretor João Borges parte do particular geográfico da rua em Belo Horizonte que dá nome ao filme para investigar o mais do que extenso universo da prostituição.

O projeto teve início de um processo de pesquisa iniciado em 2016, quando Borges participou de uma residência artística, em parceria com a Associação das Prostitutas de Minas Gerais (APROSMIG), realizada nos hotéis de prostituição da rua Guaicurus. Ele produziu, na ocasião, uma série de imagens reais usando uma câmera de infravermelho, para posteriormente, escrever o projeto para o filme. Nesta segunda fase, foi auxiliado por Marina França, pesquisadora do tema, e Francilins Castilho, fotógrafo e artista plástico.

“A elaboração de um roteiro híbrido me ajudou a ter maior controle sobre o plano de filmagens, as locações, os personagens e atores que toparam participar”, afirma o cineasta. Borges conta ainda que um dos maiores desafios foi conseguir autorização de clientes e dos donos de hotéis para as filmagens.  “Por isso convidamos atores para desempenhar esses papéis. Convidei também uma atriz para fazer o papel da prostituta que estava começando na profissão. Os atores interpretaram seus personagens inspirados em histórias que foram contadas durante o processo de pesquisa”.

O esforço foi dos mais compensatórios. “Rua Guaicurus” é uma obra que consegue equilibrar uma forte dose de sensibilidade humana a um profundo senso de realidade. O espectador é jogado, sem filtros, não somente para o universo real dos prostíbulos como também – e principalmente – para dentro dos quartos e das almas das prostitutas. Sem cair em fáceis armadilhas dramatúrgicas reducionistas, e mantendo toda a dignidade necessária de todos os envolvidos.

Uma estreia – em longas – de grande vigor e qualidade do até então curta metragista João Borges. O filme entra em cartaz nesta quinta, 14/07, em Belo Horizonte, São Paulo, Salvador, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Manaus, Brasília e Balneário Camboriú.