“DESONRA” FAZ UM DOLORIDO PAINEL SOBRE A INTOLERÂNCIA

Um dos conceitos orientais mais difíceis de serem amplamente compreendidos pelo mundo ocidental talvez seja o da Honra. É nebuloso para nós, à esquerda de Greenwich, captar perfeitamente o sentido da integridade oriental, dos suicídios realizados em nome da honestidade, e do grau de importância que a retidão dos comportamentos assume na sociedade asiática. Principalmente na japonesa.

O filme “Desonra” (exibido na 29ª. Mostra de Cinema de São Paulo como “Humilhação”) é uma dura e cruel radiografia sobre o tema. Baseado em fatos reais, ele se centraliza em Yuko (Fusako Urabe), uma jovem japonesa que se alistou como voluntária na Guerra do Iraque, mas cometeu o terrível “pecado” de regressar viva à sua Pátria. “Você não foi lá para morrer?” perguntam a Yuko. Exatamente por não ter morrido pelo seu país, Yuko é tratada com pária, agredida física e moralmente, taxada como um câncer a ser extirpado, um símbolo vivo do que pior poderia existir naquela intolerante sociedade oriental. Uma humilhação extensiva à família.

Escrito e dirigido por Masahiro Kobayashi, “Desonra” trata do tema de forma árida e contundente. É seco e ríspido como o assunto exige. Os dias de Yuko são sempre nublados, cinzas. Não há cores fortes em sua vida. À exceção dos créditos finais, também não há música. Em seu lugar, um doloroso silêncio sepulcral que amplia ruidosamente os sons de cena, sejam os pneus da bicicleta da protagonista, sejam as ondas do mar que ela ouve da janela do seu apartamento. Mar, por sinal, que pode significar redenção, já que talvez sua única saída seja deixar – novamente – o seu país/ilha.

“Desonra” critica a intolerância de uma sociedade fechada, ao mesmo tempo em que enfoca este estranho processo de globalização pelo qual todos estamos passando. Numa cena-chave, Yuko, proibida de comprar a tradicional comida japonesa que tanto gosta, contorna o problema com um impessoal lanche no McDonald´s. É preciso mudar para sobreviver, mesmo que para isso as raízes culturais sejam abandonadas.
O filme não julga; só mostra. E é perturbador em seu enfoque.